Naquela época as coisas eram mais simples. Meus cabelos eram vermelhos, era uma aluna de boas notas, tomava sorvete na véspera das provas de geografia, minha mãe não fumava e morávamos juntas na recém comprada casa da rua Salustiano Nunes. Já via o mundo de forma diferente, mas não via o mundo de forma completa.
Reformamos a casa antes de nos mudarmos. Fizemos uma cozinha onde era a varanda e uma varandinha onde não tinha nada. Reformamos o banheiro que agora precisa de uma nova reforma. Mudamos o piso. Pintamos as paredes externas naquele amarelo que até hoje não sei de quem foi a ideia. Mas,sonhamos muito com a cozinha. Eu pedi uma bancada, mas ela nunca chegou a ser encomendada.
Mesmo que grande parte de nossos planos ainda não tenham acontecido, ela se tornou o melhor lugar da casa. Às vezes minha mãe colocava música e dançava ali com o Vanderley. A televisão do quarto passou para a cozinha, onde ficávamos sentadas vendo Gilmore Girl’s antes de começarmos a fazer o almoço de domingo.Eu e o Lucas travávamos uma lutinha básica por ali, ele também tinha o golpe baixo de me dar uma queda e partir para a cosquinha. Sempre que falava ao telefone, sentava em um canto perdido da cozinha. Era onde tomávamos um café a qualquer hora do dia ou da noite conversando sobre qualquer coisa.
Não foi porque era o lugar da casa onde havia comida, até porque não comíamos na cozinha, mas sim na sala. Não foi porque é o lugar onde não se é tão abafado e não fede a chulé dos meninos. Foi simplesmente porque na cozinha tem um atrativo para grandes conversas e momentos tecnicamente diferentes.
Reparei logo que conversas de cozinha são muito mais interessantes, e quando passadas para outro lugar da casa, perdem o encanto, a intimidade, ou sei lá o que certamente seja o segredo do mistério à bolonhesa. Tanto faz a cozinha, desde que seja uma cozinha. Coisa básica,coisa boba.
_Vamos para a sala?Vai começar o programa da Ellen. – pensando ser um convite irrecusável.
_Estamos conversando na cozinha Thaís! – disse em tom perplexo.
_A gente conversa na sala!- insiste como se eu não houvesse entendido a questão.
_Você não entende. Estamos conversando na cozinha! – depois disso passamos para a sala e a conversa morre de morte súbita.
Porque tudo que é intimo é levado para a cozinha. Não se recebe pessoas que não temos intimidade pela porta da cozinha e nem esperamos que ela nos veja lavando louça ou os farelos de pão na mesa. Porque é basicamente um gosto irremediavelmente agridoce. Algo acompanhado com alcaparras, coisas assim. E se não for abuso, com o rosto propositalmente sujo com massa crua de panquecas com direito a pergunta “Posso fazer um Sol?”.
Conversas à bolonhesa. Molho branco. Quatro queijos. Frango com Catupiry. Creme. Borda recheada. Pimenta calabresa. Fazendo a gente degustar algo com prazer. Claro,isso não tem nada a ver com comida.
_Estamos conversando na cozinha Thaís! – disse em tom perplexo.
_A gente conversa na sala!- insiste como se eu não houvesse entendido a questão.
_Você não entende. Estamos conversando na cozinha! – depois disso passamos para a sala e a conversa morre de morte súbita.
Porque tudo que é intimo é levado para a cozinha. Não se recebe pessoas que não temos intimidade pela porta da cozinha e nem esperamos que ela nos veja lavando louça ou os farelos de pão na mesa. Porque é basicamente um gosto irremediavelmente agridoce. Algo acompanhado com alcaparras, coisas assim. E se não for abuso, com o rosto propositalmente sujo com massa crua de panquecas com direito a pergunta “Posso fazer um Sol?”.
Conversas à bolonhesa. Molho branco. Quatro queijos. Frango com Catupiry. Creme. Borda recheada. Pimenta calabresa. Fazendo a gente degustar algo com prazer. Claro,isso não tem nada a ver com comida.
E eu achando que era o único que não via a menininha...
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