domingo, 13 de janeiro de 2013

[Uma aquarela que não (?) descolorirá]

Por Bia Rebello


 Essa semana todo mundo em casa está viajando, é boa a sensação de paz, é ruim a sensação de solidão. Você também viajou pra longe de mim. Na verdade, você já planejava essa viagem há tempos, eu até que suspeitei, mas não pude prever a hora do embarque. Soube que você comprou a passagem só de ida. O que aconteceu com a passagem de volta pra mim? Você estava sem dinheiro? Eu te emprestava, poxa. A fila estava muito grande? Eu sei, você não é paciente. Mas deveria ter feito um esforço, deveria ter me falado a tempo. Eu pegaria a fila por você. Eu pegaria a fila, o metrô cheio, eu pegaria até chuva e gripe. Eu pegaria na sua mão pra você esperar sua vez. Mas agora não dá mais. É uma pena que ficou tarde e eu só pude olhar você ir. Eu até pensei em subir na sua mala ou sumir com ela. Pensei em gritar: "Está ficando tudo escuro por sua culpa!”. Pensei em pedir educadamente pra você devolver meu coração que estava dobradinho nas suas coisas (provavelmente entre uma daquelas meias que você sempre me emprestava). Eu pensei em tanta coisa, mas não dava mais tempo. Seu ônibus já ia partir, meu coração já estava partido. O que mais você enfiou na sua mala? Devolve minha alegria! Você também vai levar os nossos planos? Deveria ao menos deixar meus olhos aqui quietinhos, eles tremem. Eu não me lembro de ter feito um acordo onde concordava que você levaria tudo de mim quando partisse. Antes de abaixar pra juntar meus cacos, sussurrei: "Não use nossos apelidos com mais ninguém". Ora essa, como se as pessoas fossem substituíveis. Pessoas são descartáveis, não substituíveis. Pessoas são únicas. Não era pra você rir, eu estava falando sério. Eu só queria falar que eu te amava e que o único plano era guardar tudo no peito. Mas você ria e chorava e isso me doía em cada músculo do corpo.Com um tchau amarelado eu me virei e tive a sensação de que aquela multidão inteira acompanhava nossa história. Sentia vários olhares atentos, prontos pra me aplaudir ou vaiar de vez. Eu fiquei procurando em cada olhar as cores que você me prometeu que não se apagariam. "Talvez as lágrimas estejam desbotando tudo" pensei. Mas não era. Te olhei de novo e vi que tudo estava realmente cinza. Mas não faz mal, vou provar o tal do “tempo cura”. Enquanto isso, junto uns trocados pra comprar uma caixa de lápis de cor nova e quando eu conseguir desenhar meu próprio sol, de novo, eu te procuro pra contar. Feliz um ano de começo, meio e fim. Feliz um dia sem mim. Feliz Ano Novo

*****
O que eu bebi por você, dá pra encher um navio e não teve barril que me fez esquecer. O que eu bebi por você, nunca artista bebeu, nem pirata bebeu, nem ninguém vai beber.


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