Por Bia Rebello
Essa
semana todo mundo em casa está viajando, é boa a sensação de paz, é ruim a
sensação de solidão. Você também viajou pra longe de mim. Na verdade, você já
planejava essa viagem há tempos, eu até que suspeitei, mas não pude prever a
hora do embarque. Soube que você comprou a passagem só de ida. O que aconteceu
com a passagem de volta pra mim? Você estava sem dinheiro? Eu te emprestava,
poxa. A fila estava muito grande? Eu sei, você não é paciente. Mas deveria ter
feito um esforço, deveria ter me falado a tempo. Eu pegaria a fila por você. Eu
pegaria a fila, o metrô cheio, eu pegaria até chuva e gripe. Eu pegaria na sua
mão pra você esperar sua vez. Mas agora não dá mais. É uma pena que ficou tarde
e eu só pude olhar você ir. Eu até pensei em subir na sua mala ou sumir com
ela. Pensei em gritar: "Está ficando tudo escuro por sua culpa!”. Pensei
em pedir educadamente pra você devolver meu coração que estava dobradinho nas
suas coisas (provavelmente entre uma daquelas meias que você sempre me
emprestava). Eu pensei em tanta coisa, mas não dava mais tempo. Seu ônibus já
ia partir, meu coração já estava partido. O que mais você enfiou na sua mala?
Devolve minha alegria! Você também vai levar os nossos planos? Deveria ao menos
deixar meus olhos aqui quietinhos, eles tremem. Eu não me lembro de ter feito
um acordo onde concordava que você levaria tudo de mim quando partisse. Antes
de abaixar pra juntar meus cacos, sussurrei: "Não use nossos apelidos com
mais ninguém". Ora essa, como se as pessoas fossem substituíveis. Pessoas
são descartáveis, não substituíveis. Pessoas são únicas. Não era pra você rir,
eu estava falando sério. Eu só queria falar que eu te amava e que o único plano
era guardar tudo no peito. Mas você ria e chorava e isso me doía em cada
músculo do corpo.Com um tchau amarelado eu me virei e tive a sensação de que
aquela multidão inteira acompanhava nossa história. Sentia vários olhares
atentos, prontos pra me aplaudir ou vaiar de vez. Eu fiquei procurando em cada
olhar as cores que você me prometeu que não se apagariam. "Talvez as
lágrimas estejam desbotando tudo" pensei. Mas não era. Te olhei de novo e
vi que tudo estava realmente cinza. Mas não faz mal, vou provar o tal do “tempo
cura”. Enquanto isso, junto uns trocados pra comprar uma caixa de lápis de cor
nova e quando eu conseguir desenhar meu próprio sol, de novo, eu te procuro pra
contar. Feliz um ano de começo, meio e fim. Feliz um dia sem mim. Feliz Ano
Novo
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O que eu bebi por você, dá pra encher um navio e não teve barril que me fez esquecer. O que eu bebi por você, nunca artista bebeu, nem pirata bebeu, nem ninguém vai beber.