quarta-feira, 31 de março de 2010

Conversa de sofás

por: Paula Rios


Sentados no sofá, e com aquela sensação de tentar deixar tudo pra mais tarde (inclusive o verão), trocaram de canal e começaram a ver uma reportagem sobre o aquecimento global. Trocaram olhares e mudaram de canal de novo. Dessa vez, a reportagem era sobre culinária. Mais especificamente, sobre os prazeres da culinária francesa. Ele não entendeu uma vírgula, enquanto ela anotava todas. Olhou pra ela como quem pedia piedosamente para não assistir aquilo, pelo amor de Deus. Mas a concentração dela era tanta, que nem viu quando ele levantou do sofá e foi tomar um banho e saiu. Quando notou, estava em casa sozinha. Anotando 832 receitas por minuto. De doce, à parmegiana, suflê e etc. Por fim, rendeu-se e desligou a televisão.


Foi pra cozinha preparar um daqueles pratos. Desistiu quando queimou o fundo da panela pela terceira vez. Ele chegou, tirou os sapatos, deu um beijo nela e devido às condições da cozinha, pegou o telefone e pediu comida japonesa. Ela deu um sorriso sem graça e percebeu que não ficava sozinha com ele havia muito tempo. Pense: dois filhos pra criar e trabalhando. Era dureza. Ela nunca reclamou. Acho que ela até gostava disso tudo. Da vida numa cidade pacata. Do cachorro no quintal. Das crianças chorando. Mas ficar sozinha com ele, a deixava nervosa. Tinha medo dele não querer nada com ela. Ou de ficarem sem assunto. De brigarem por qual canal sintonizar num domingo de tarde. Desejou desesperadamente que as filhas chegassem do acampamento. Ou que o telefone tocasse. Ou que o mundo desabasse sobre sua cabeça. Tudo, menos ficar no silêncio com ele.


Notando seu desconforto, o bom marido simplesmente não falou nada. Apenas a abraçou. Isso a deixou mais segura, mas não menos nervosa. Então, ele sussurrou baixinho no ouvido dela: “Eu ainda te amo, sabia?” Como se ele tivesse lido seus pensamentos. Rubra de vergonha, ela apenas o abraçou mais apertado.


Mais tarde, eles voltaram para o sofá. Agora, com a esperança de ver algum filme bacana na TV. Em vão. Então, ela sugeriu que locassem um. Ele concordou e saiu para a locadora mais próxima. Chegando em casa, a viu dormindo no sofá. Riu da incapacidade dela de conseguir ver um filme todo até o final e que desta vez tenha conseguido se superar. Levou ela pro quarto, a cobriu e deitou ao seu lado. Na hora que ia apagar as luzes, ela vira pro lado e dá um beijo nele.


- “Obrigada pela noite maravilhosa.”
- “Mas você nem viu o filme que queria.”
- “Não importa. Eu ia perder o final de qualquer jeito mesmo!”


Sorriram e cada um virou pro canto na tentativa de apagar logo de uma vez e não ter muito tempo pra pensar na audiência de separação no outro dia pela manhã.


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As ondas nos trazem esperança
As torres nos mostram o fim


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Agradecimentos à Tia Paulinha que ficou a semana passada toda escrevendo um texto para o blog. Esse foi o ultimo que ela escreveu e também o melhor de três. Esperando agora os outros colaboradores.

domingo, 21 de março de 2010

Amores Imperfeitos

Às vezes é assim, tiro o dia para um programa individual, não estou falando do meu novo vício com o twitter. Trabalhei pela manha e fui ao shopping pela tarde, gosto de ir ao cinema sozinha e acredite, é impagável. Tem seu encanto ir com os amigos, tem seu encanto estar de mãos dadas no cinema, mas é diferente de ir sozinha, é revelador ir sozinha.
Sentei esparramada em uma das poltronas centrais, música clássica enquanto o filme não começa e um mega sanduíche gorduroso com Coca-cola e batata frita. Logo temos as risadas, as aflições, os romances, minha camisa suja e tudo mais. Bom, o filme acaba desagradando a maioria, mas eu gosto, acho ótimo o final. Ele acaba sozinho, sem a mulher que estava apaixonado e que era a única que o faria parar em um lugar. Termina também sem amigos. Ele termina sozinho mesmo tendo se esforçado para ter aquilo tudo. As pessoas se levantam e comentam ao sair da sala “que final estranho”. Eu levanto também e rio quieta e feliz, acho sensacional.
Gosto de finais mal fracassados (definição disso é que o mal fracassado vai além do fracasso), aqueles trágicos, onde as pessoas que esperávamos encontrar na cena contente do final do filme, morrem. Ou onde os amores promissores não dão certos.
Não apenas para filmes, mas para livros, para textos, para músicas. Desencontros amorosos são, definitivamente, um charme. Não, não me entendam mal, não acho que seja uma coisa feliz e bacana para se viver, mas é o que existe de mais inspirador.
Entenda o que quero dizer, na vida real, além das melodias e letras, além dos créditos de produção, isso não é legal. Meninas chorando, pote de sorvete na hora da fossa, falta de esperança, noites solitárias em um aeroporto e mensagens bobas em um domingo pela tarde não é uma realidade boa. Mas se esse sofrimento é bom para alguma coisa, bom, é bom para inspirar e fazer da vida um lugar de boas poesias, músicas e romances trágicos que são completamente apaixonantes e deliciosos.
Não venha tentar criar romances desencontrados em sua vida de cheiros, mas se for para me encantar e inspirar, apenas a mim, tudo pode dar errado no final.

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Essa semana, se tudo der certo, teremos companhia aqui no blog.